terça-feira, 27 de setembro de 2016

"A Bíblia não é um livro preconceituoso"


Por Gabriele Duarte - Diário de Santa Catarina
Lançado neste mês em São Paulo, Teologia Inclusiva é o quinto livro do pastor brasiliense Alexandre Feitosa, 39 anos, que desde 2006 se debruça sobre as questões que envolvem religião, homossexualidade e transexualidade no país e no mundo. Confira a entrevista com o especialista, membro da Comunidade Athos, uma das primeiras igrejas inclusivas do Brasil:
O que é a Teologia Inclusiva?
A Teologia Inclusiva começou como uma revisão crítica dos textos bíblicos convencionalmente utilizados para condenar a homossexualidade. Essa abordagem teve início na Inglaterra por meio de clérigos anglicanos na década de 1950. Desde então, os conceitos bíblicos tradicionais sobre a homossexualidade começaram a ser questionados. Nas décadas seguintes, especialmente nos Estados Unidos, os estudos sobre Bíblia e homossexualidade se multiplicaram, resultando em diversas publicações. As conclusões eram sempre as mesmas: a Bíblia não condena a homossexualidade, logo, não haveria razão alguma para excluir da Igreja as pessoas homossexuais. A Teologia Inclusiva é, portanto, uma abordagem bíblica que permite uma compreensão para além da literalidade textual. Seu pilar está na graça divina, segundo a qual Deus não faz distinção de pessoas, antes, todos desfrutam do mesmo status, independentemente de suas singularidades. Para ser alcançado pela graça, basta ser humano. Nada mais.

A Bíblia condena as minorias sexuais? É um livro preconceituoso?
É errôneo pensar que a Bíblia condena as minorias sexuais. As escrituras nasceram em um contexto cultural que desconhecia a diversidade sexual, portanto, seus autores não poderiam fazer qualquer referência ao que hoje conhecemos como orientação sexual e identidade de gênero. Preconceituosas são as leituras descontextualizadas que geram opressão e discriminação. Esse tipo de leitura foi responsável pela escravização de pessoas negras, pela segregação racial, pela proibição do casamento misto (entre brancos e negros nos Estados Unidos) e pela dominação masculina sobre as mulheres. Infelizmente, a Bíblia ainda é usada para excluir e oprimir a comunidade LGBT. A Teologia Inclusiva busca combater leituras opressivas e demonstrar que a Bíblia não é um livro preconceituoso. A Teologia Inclusiva procura enfatizar um princípio bíblico fundamental: Deus não faz acepção de pessoas. 

Que tipo de interpretação bíblica é necessária para incluir o grupo LGBT?
Só há uma forma de interpretar a Bíblia de forma a incluir todas as pessoas: abandonar leituras literais e superficiais e aprofundar-se na contextualização textual, histórica e cultural. O segundo passo é compreender corretamente a mensagem do Evangelho e a perspectiva de Cristo, que jamais discriminou pessoas, antes, caminhou em direção aos marginalizados de seu tempo, especialmente os excluídos pela religião institucional. 

Como as igrejas inclusivas trabalham com esse público?
Pregando o Evangelho exatamente como ele é: inclusivo por essência. As Igrejas Inclusivas procuram contemplar a realidade da comunidade LGBT. Embora o Evangelho seja universal, tais pessoas esperam ser vistas, notadas em suas necessidades afetivas e espirituais. As Igrejas Inclusivas estão sensíveis a essa demanda e procuram contextualizar a mensagem de Cristo, oferecendo um discurso que não está disponível nas igrejas cristãs convencionais. São pessoas cansadas, feridas pelo fundamentalismo religioso, porém, sedentas por encontrar um lugar onde possam relacionar-se com Deus e com o próximo, professando sua fé e vivenciando sua afetividade sem culpas ou cobranças.

Em uma igreja inclusiva, tudo é liberado?
Não. Embora apresentem diferenças doutrinárias e litúrgicas, no geral, as Igrejas Inclusivas pregam contra a promiscuidade, o sexo sem compromisso, os vícios e coisas semelhantes, tal qual ocorre com as demais igrejas cristãs. 

As igrejas convencionais impõem muita resistência ao formato inclusivo?
Sim. Para a grande maioria das igrejas, os LGBT são vistos como abominação, como pervertidos sexuais e pessoas que, deliberadamente, estão indo contra a natureza e contra o modelo relacional estabelecido por Deus; por essa razão, não devem ser aceitos, a não ser que sigam a heteronormatividade [norma dominante que dita o heterossexual como certo]. Os cristãos LGBT são vistos como pessoas indignas de estarem dentro de uma igreja, quer como membros, quer ocupando alguma posição eclesial. As denominações Inclusivas não são reconhecidas como igrejas, mas como seitas. Felizmente, há exceções. Lideranças cristãs importantes já têm compreendido que não há condenação bíblica aos LGBT e já começaram a abrir suas igrejas para esse público. É o caso da Igreja Batista do Pinheiro em Maceió (AL), do Caminho da Graça (em todo o Brasil) e da Igreja Vivo por Ti, em Taguatinga (DF). 

As primeiras igrejas
— No Brasil, as primeiras tentativas de implantação de comunidades cristãs inclusivas datam de 1980, por meio de pessoas ligadas à Igreja da Comunidade Metropolitana, a primeira denominação cristã inclusiva do mundo, fundada em Los Angeles em 1968 pelo reverendo Troy Perry.
— Entretanto, somente em 2002, em São Paulo, nasceria a primeira igreja inclusiva no Brasil com o protagonismo de um pastor assumidamente homossexual, o teólogo chileno radicado no Brasil, Victor Orellana.
— Desde então, dezenas de denominações inclusivas têm surgido em vários estados brasileiros, especialmente nas capitais. 
 — 10 mil é o número estimado de membros dessas igrejas, incluindo não apenas a comunidade LGBT, mas um número considerável de heterossexuais.
— Em Santa Catarina, a igreja inclusiva chegou há quatro meses, em Joinville, a Arena Apostólica Church, fundada há um ano em Curitiba pelo apóstolo Chlisman Toniazzo.
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