terça-feira, 28 de junho de 2011

Pastor Luterano Defende a Homoafetividade

                                                                                                                                                        Por SILVIO MEINCKE
No Dia da Igreja em Colônia, na Alemanha, trabalhei como voluntário e fui hospedado em casa particular. Meus hospedeiros eram gentis e atenciosos. Sua casa revela traços da personalidade dos moradores: gostam da beleza simples e prática, sem sofisticações, com critério na escolha e nada de consumismo exagerado. Percebi grande consciência ecológica na organização da casa, no uso de água e energia, na seleção do lixo ou nos cuidados do pequeno jardim. O modo como meus hospedeiros convivem e se comunicam revela atenção carinhosa, respeito e cuidado mútuos, como acontece entre casais que são felizes e se enriquecem mutuamente.

Meus hospedeiros são dois jovens homoafetivos. Prefiro essa palavra. Homoafetividade. O termo homossexualidade soa-me muito restrito à prática sexual física propriamente dita. Homoafetividade sugere uma relação muito mais ampla: homo-convivência, homo-partilha, homo-cuidado, homo-ternura, homo-realização como ser humano.

Os próprios envolvidos devem decidir sobre o termo que querem usar. Eu vou dizer homoafetividade. Também são eles que devem decidir se querem entender a sua homoafetividade como opção ou como condição.

Eu vou dizer que é uma condição humana, porque os jovens e do ensino confirmatório, da juventude evangélica e das escolas secundárias onde lecionei, quando me procuraram como pastor, sempre vieram desesperados ao descobrirem sua homoafetividade, e nenhum deles ou delas optou por isso. Descobriram-na e sofreram. Não contribuíram em nada para que fossem homoafetivos.

Não resta dúvida que cada grupo humano precisa criar regras de convivência, leis de conduta, normas de orientação, para que a vida em comunidade seja possível. Precisa encontrar consensos, escritos ou não, que possibilitam a vida organizada e feliz dentro do seu território, dentro do seu espaço de habitação - para dizê-lo com uma palavra grega, dentro do seu "étos". O conjunto dos regulamentos, costumes convencionados, consensos escritos ou não formam os valores "éticos" de uma sociedade. 
SILVIO MEINCKE é pastor emérito
da Igreja Evangélica
da Confissão Luterana
Brasileira e reside na Alemanha

Na medida em que os grupos humanos decidem como querem organizar sua convivência, também decidem como não querem viver. Existe até mesmo certa necessidade de distanciar-se dos que são diferentes, para firmar a própria identidade. Por exemplo, o povo de Israel declarou o porco impuro entre outros motivos para se diferenciar de outros povos que o adoravam como animal sagrado.

Infelizmente, essa necessidade de diferenciar-se acontece não raras vezes à custa de minorias numéricas para as quais se cria uma imagem de inimizade. Tal imagem se agiganta e pode adquirir formas de brutal discriminação, perseguição e eliminação. 
 
Pessoas homoafetivas têm experimentado a discriminação no decorrer da história, às vezes, tornando-se bodes expiatórios para insucessos, fracassos e frustrações de todo um povo. Ainda que as pessoas homoafetivas não prejudiquem em nada a feliz convivência no "étos", a sina da discriminação insiste em persegui-los. Meus hospedeiros, por exemplo, em nada prejudicam a possibilidade de vida boa e feliz dos moradores de Colônia.

Seguidores de Jesus Cristo podem conhecer, nos seus ensinamentos e no seu procedimento, grandes exemplos de acolhimento, inclusão e fraternidade com as minorias discriminadas pela sociedade. Amplos setores das igrejas cristãs assimilaram essa mensagem de Jesus e procuram agir dentro do seu propósito de inclusão. 
    
Tanto mais lamentável se mostra a discriminação praticada por certos grupos dentro das comunidades cristãs - geralmente grupos terrivelmente "fortes na fé" e que, por isso, julgam-se pessoas melhores do que as que não aderiram ao seu grupo. Não estariam esses grupos incorrendo no equívoco de criar bodes expiatórios para os seus próprios medos e preconceitos? Não estariam desconhecendo os propósitos de Jesus, em nome do qual alegam agir? Não estariam caindo no equívoco de George Bush que pretende prescrever a Deus quem são os seus inimigos, para destruí-los, em nome de Deus?

No entanto, os nossos inimigos não são os inimigos de Deus; os que nós consideramos merecedores de discriminação, Deus não os discrimina. Nem mesmo precisamos recorrer a alguma piedosa generosidade - aliás, sempre humilhante - e dizer que aceitamos em nosso meio as pessoas homoafetivas em nome do amor cristão. Melhor é tê-las em nosso meio espontaneamente, sem justificativas piedosas, simplesmente como semelhantes, que não trazem mais do que apenas outra condição afetiva. Melhor do que incluí-los generosamente depois de excluí-los primeiro, é nem chegar a excluí-los.

4 comentários:

  1. Linda declaração. Concordo plenamente com as palavras do Pr. Silvio Meincke. Quem me dera, as igrejas em geral, enxergassem o coração, ao invés de julgarem cegamente o exterior das pessoas. Homoafetividade, homossexualidade. acho que todas as palavras são louváveis, pois, em síntese, descrevem simplesmente uma sexualidade diferente, mas não errante. Em certo post aqui do Blog, vi alguém perguntar "por quê Deus criaria sexualidades diferentes?". Posso simplesmente contra-argumentar, dizendo "por que eu não sou igual a você, e você não é igual a mais ninguem, em todos os sentidos?". Deus nos criou como seres únicos, dotados de diferenças - que devem ser respeitadas - e isso é o que faz a humanidade ser uma dádiva divina.

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  2. Olá, Ângelo. Tudo bem? Obrigado pelo seu comentário! Suas colocações são muito importantes e vão ao encontro daquilo que temos pregado continuamente aqui!

    Volte sempre! Você é bem-vindo!

    Abraços,

    Alexandre Feitosa

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  3. Alexandre,

    Esse pastor conseguiu compreender o que é o verdadeiro amor de Cristo!!!! Não importa o rótulos, os esteriótipos.

    O essencial é sermos quem somos com dedicação e singeleza de coração!


    Abraços


    Ricardo

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  4. Olá. Bom, conheci esse blog através de uma página no facebook. De cara vi esse post do Pastor e fiquei, na falta de palavra melhor, impressionado.
    Já passei por muitas "dificuldades" por conta da minha orientação sexual, mas nada que me desmotivasse. Afinal, gosto de ser gay, gosto do que sou.
    Eu fui criado, durante um período da minha vida em uma igreja evangélica, logo na fase que estava me conhecendo(8-12 anos)e isso marcou muito minha vida, por que eu sempre ouvi algo do tipo: " ser gay é pecado", "Deus não ama os gays". Não necessariamente ouvia na Igreja, mas parte da família também. Por sorte ou sei lá, vontade divina, minha mãe, a base de toda a minha sustentação, nunca pisara em uma Igreja ou julgou alguém pelas formas que a pessoa veio ao mundo. Ela foi meu Deus, minha amiga, enfim.. meu tudo. Posso dizer que até ler esse post do Pastor Silvio, estava realmente desacreditado do dito "amor" das Igrejas. De certa forma estava até tendo certas desavenças com colegas cristãos, e contra a própria religião. Eu sempre acreditei em Deus, sempre acreditei em coisas maiores do que nós. Acredito, que nessa noite, foi Ele quem me mandou entrar lá no face ( pode até soar uma certa pretensão da minha parte) e ver que alguns conceitos meus estavam equivocados.

    Valeu..

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